domingo, junho 24, 2007

Entrevista do Marcola

feita pelo O GLOBO em 23/05/2006 fonte: site TERNUMA
Estamos todos no inferno. Não há solução; pois,
não conhecemos nem o problema.


Você é do PCC?

- Mais que isso, eu sou um sinal de novos tempos. Eu era pobre e invisível... Vocês nunca me olharam durante décadas... E antigamente era mole resolver o problema da miséria... O diagnóstico era óbvio: migração rural, desnível de renda, poucas favelas, ralas periferias... A solução é que nunca vinha... Que fizeram? Nada. O governo federal alguma vez: alocou uma verba para nós? E nós só aparecíamos nos desabamentos no morro ou nas músicas românticas sobre a "beleza dos morros ao amanhecer", essas coisas... Agora, estamos ricos com a multinacional do pó. E vocês estão morrendo de medo... Nós somos o início tardio de vossa consciência social... Viu? Sou culto... Leio Dante na prisão...

- Mas... A solução seria...

- Solução? Não há mais solução, cara... A própria idéia de "solução" já é um erro. Já olhou o tamanho das 560 favelas do Rio? Já andou de helicóptero por cima da periferia de São Paulo? Solução como? Só viria com muitos bilhões de dólares gastos organizadamente, com um governante de alto nível, uma imensa vontade política, crescimento econômico, revolução na educação, urbanização geral; e tudo teria de ser sob a batuta quase que de uma "tirania esclarecida", que pulasse por cima da paralisia burocrática secular, que passasse por cima do Legislativo cúmplice (ou você acha que os 287 sanguessugas vão agir? Se bobear, vão roubar até o PCC...) e do Judiciário, que impede punições. Teria de haver uma reforma radical do processo penal do país, teria de haver comunicação e inteligência entre polícias municipais, estaduais e federais (nós fazemos até conference calls entre presídios...). E tudo isso custaria bilhões de dólares e implicaria numa mudança psico-social profunda na estrutura política do país. Ou seja: é impossível.Não há solução.

- Você não tem medo de morrer?

Vocês é que têm medo de morrer, eu não. Aliás, aqui na cadeia vocês não podem entrar e me matar... Mas eu posso mandar matar vocês lá fora... Nós somos homens-bomba. Na favela tem cem mil homens-bomba... Estamos no centro do Insolúvel, mesmo... Vocês no bem e eu no mal e, no meio, a fronteira da morte, a única fronteira. Já somos uma outra espécie, já somos outros bichos, diferentes de vocês. A morte para vocês é um drama cristão numa cama, no ataque do coração... A morte para nós é o presunto diário, desovado n’uma vala... Vocês, intelectuais, não falavam em luta de classes, em "seja marginal, seja herói"? Pois é: chegamos, somos nós! Ha, ha... Vocês nunca esperavam esses guerreiros do pó, né? Eu sou inteligente. Eu leio, li 3.000 livros e leio Dante... Mas, meus soldados todos são estranhas anomalias do desenvolvimento torto desse País. Não há mais proletários ou infelizes ou explorados. Há uma terceira coisa crescendo aí fora, cultivado na lama, se educando no absoluto analfabetismo, se diplomando nas cadeias, como um monstro Alien escondido nas brechas da cidade. Já surgiu uma nova linguagem. Vocês não ouvem as gravações feitas "com autorização da Justiça"? Pois é. É outra língua. Estamos diante de uma espécie de pós-miséria. Isso. A pós-miséria gera uma nova cultura assassina, ajudada pela tecnologia, satélites, celulares, internet, armas modernas. É a merda com chips, com megabytes. Meus comandados são uma mutação da espécie social, são fungos de um grande erro sujo.

- O que mudou nas periferias?

Grana. A gente hoje tem. Você acha que quem tem US$ 40 milhões, como o Beira-Mar, não manda? Com 40 milhões a prisão é um hotel, um escritório... Qual a polícia que vai queimar essa mina de ouro, tá ligado? Nós somos uma empresa moderna, rica. Se funcionário vacila, é despedido e jogado no "microondas"... ha, ha... Vocês são o Estado quebrado, dominado por incompetentes. Nós temos métodos ágeis de gestão. Vocês são lentos e burocráticos. Nós lutamos em terreno próprio. Vocês, em terra estranha. Nós não tememos a morte. Vocês morrem de medo. Nós somos bem armados. Vocês vão de três-oitão. Nós estamos no ataque. Vocês, na defesa. Vocês têm mania de humanismo. Nós somos cruéis, sem piedade. Vocês nos transformam em superstars do crime. Nós fazemos vocês de palhaços. Nós somos ajudados pela população das favelas, por medo ou por amor. Vocês são odiados. Vocês são regionais, provincianos. Nossas armas e produto vêm de fora, somos globais. Nós não esquecemos de vocês, são nossos fregueses. Vocês nos esquecem assim que passa o surto de violência.

- Mas o que devemos fazer?

Vou dar um toque, mesmo contra mim. Peguem os barões do pó! Tem deputado, senador, tem generais, tem até ex-presidentes do Paraguai nas paradas de cocaína e armas. Mas quem vai fazer isso? O Exército? Com que grana? Não tem dinheiro nem para o rancho dos recrutas... O país está quebrado, sustentando um Estado morto a juros de 20% ao ano, e o Lula ainda aumenta os gastos públicos, empregando 40 mil picaretas. O Exército vai lutar contra o PCC e o CV? Estou lendo o Klausewitz, "Sobre a guerra". Não há perspectiva de êxito... Nós somos formigas devoradoras, escondidas nas brechas... A gente já tem até foguete antitanques... Se bobear, vão rolar uns Stingers aí... P’ra acabar com a gente, só jogando bomba atômica nas favelas... Aliás, a gente acaba arranjando também "umazinha", daquelas bombas sujas mesmo... Já pensou? Ipanema radioativa?

- Mas... não haveria solução?

Vocês só podem chegar a algum sucesso se desistirem de defender a "normalidade". Não há mais normalidade alguma. Vocês precisam fazer uma autocrítica da própria incompetência. Mas vou ser franco... Na boa... Na moral... Estamos todos no centro do insolúvel. Só que nós vivemos dele e vocês... Não tem saída. Só a merda. E nós já trabalhamos dentro dela.
Olha aqui, mano, não há solução. Sabe por quê? Porque vocês não entendem nem a extensão do problema. Como escreveu o divino Dante: "Lasciate ogna speranza voi che entrate!" Percam todas as esperanças. Estamos todos no inferno.

quarta-feira, junho 13, 2007

E não vale a lei para os compadres do rei?

José Nêumanne - Estadão 13 junho de 2007

Este jornal noticiou anteontem em manchete que a Polícia Federal (PF) concentrará o inquérito da Operação Xeque-Mate no petista Dario Morelli, compadre do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e tido como sócio de Nilton Cezar Servo, apontado como chefe da máfia desbaratada, que explorava caça-níqueis. A sentença enunciada nesta abertura de texto contém um teor explosivo que os cuidados nela exigidos e exibidos podem não bastar. De um lado, um chefe de governo, que deve ser ilibado por definição. Do outro, um suspeito de pertencer ao crime organizado. E, no meio dos dois, o compadre, o sócio. Convém, pois, esclarecer logo que o compadrio é uma prática antiga na política nacional. Próceres batizam filhos de seus eleitores com prodigalidade demais e, normalmente, atenção de menos. Quando Leonel Brizola pretendeu lançar-se candidato à sucessão do irmão de Neuza, sua mulher, João Goulart, tratou de preceder a campanha de um slogan, que se tornaria célebre e paradigmático: "Cunhado não é parente." Da mesma forma, hoje, da relação entre Lula e Dario é justo estabelecer que "compadre não é parente". Mas irmão é. E parente de primeiro grau. Ainda assim, não se pode inculpar Sua Excelência por nenhum dos ilícitos dos quais é acusado seu mano mais velho, Genival Inácio da Silva, o Vavá. Até Jimmy Carter teve seu irmão-problema, sem falar em nosso José Sarney, uma espécie de compadre virtual de Lula, sempre às voltas com o Vavá dele, de nome Murilo. Só que sempre fica um travinho na goela por conta da proximidade, da intimidade. Isso mesmo esquecendo logo de saída a deixa ancestral de Júlio César, que, para se livrar da bela Pompéia Sula, suspeita de receber atenções masculinas indevidas, condenou a própria cônjuge pelo fato de apenas parecer, mesmo não sendo provado que ela retribuísse tais atenções. Ao contrário dos tempos prévios àqueles famosos idos de março, esta nossa era e esta República são outras: nelas, às mulheres, aos compadres, parentes e amigos do peito não apenas se concede o direito de parecer, como o de se valer de qualquer negativa, por menos documentada que seja, como prova decisiva de sua inocência e da má-fé do acusador, seja quem for. O que difama esta República não é tanto o irmão pródigo do chefe de Estado tolerante e tolerado, mas, sim, o Estado permissivo e negligente que este comanda e o sistema de leis e normas que existem só para inglês ver (sem entender, diga-se). O Estado aprecia o espetáculo e dissemina a falsa idéia de que para punir um suspeito de ter cometido algum delito basta expô-lo à execração geral. Tolice: José Genoino ouviu imprecações do eleitorado quando foi votar, mas nem por isso deixou de ser eleito deputado federal, após ter assinado documentos para lá de heterodoxos na condição de presidente de um partido que infringiu de diversas formas a lei, que dizem ser o império de uma democracia que se preze. O conceito republicano da "mulher de César" não se aplicou ao nobre parlamentar nem atingiu seu irmão (ele também tem um irmão-problema) José Nobre Guimarães, cujo ex-assessor José Adalberto Vieira da Silva foi preso no aeroporto com US$ 100 mil na cueca. Aos protagonistas do caso em questão não se aplicou o tal conceito milenar, mas uma lei bem mais recente, cunhada pelos hábitos da República Velha e do mandonismo de Artur Bernardes: "Para os amigos, tudo; para os inimigos, o rigor da lei." Outros dois petistas foram beneficiados pelo mesmo expediente: Gedimar Passos e Valdebran Padilha foram flagrados com a chamada boca na botija, ou melhor, com a mão na massa: a PF, sempre a PF, pilhou-os com R$ 1,75 milhão num hotel perto do aeroporto e um dossiê encomendado a falsários para prejudicar o candidato do PSDB ao governo de São Paulo, José Serra, anulando seu favoritismo. Na condição de sabe-se lá o que de sabe-se lá quem ligado a alguma instância próxima ao rei (que só é paralisado, como até Ciro Gomes sabe e parece que a PF também, pelo xeque-mate), não foi lavrado o flagrante desses dois senhores, que, submetidos à prisão temporária, foram soltos no quinto dia, como manda a lei (que juiz nenhum se negará a aplicar) para este caso específico. Eles foram chamados de "aloprados" por Sua Majestade, mas até agora nada têm a pagar na Justiça. Exemplos como estes são empilhados nos arquivos dos jornais e não há espaço aqui para esgotá-los. O ex-ministro Saulo Ramos teve a pachorra de fazer as contas e, em seu livro Código da Vida, conta que a PF já processou, indiciou e prendeu 6 mil brasileiros, pela polícia espetacular dos governos Lula. Mas ninguém foi condenado. Não dá, porém, para deixar de lado o companheiro Antônio Palocci, visto pelo caseiro Francenildo Santos Costa freqüentando uma mansão suspeita, onde lenocínio e corrupção pareciam gêmeos siameses. Como Genoino, Palocci elegeu-se com facilidade deputado federal, goza de imunidade parlamentar e foro privilegiado, enquanto a testemunha infeliz perdeu emprego, mulher e paz. Nenhum dos delinqüentes que quebraram seu sigilo bancário e tornaram pública sua condição de bastardo foi punido pela lei dos homens. Todos gozam a anistia ampla, geral e irrestrita da impunidade dos todo-poderosos. Pode ser que a desproporção absurda entre os capturados pela polícia e os apenados pela Justiça se deva a excessos dos que prendem e algemam. E o ministro da Justiça, Tarso Genro, houve por bem anunciar um projeto para acabar com abusos e violências contra a cidadania como algemas, camburões e escutas telefônicas indiscriminadas. Na certa, também, a lerdeza e a permissividade do Judiciário contribuem para a conta. O certo é que a soma de tais fatores torna esta a Pátria da impunidade, em particular para parentes, compadres e amigos do rei.

http://posturaativa.blig.ig.com.br/

quarta-feira, junho 06, 2007

O Brasil está doente

ROBERTO JEFFERSON - FSP
Escancarei o mensalão. O governo não viu, não sabia, não ouviu. Exatos dois anos depois, o que temos? Manchetes sobre corrupção
O DIA 6 de junho é um marco. De vergonha. Neste dia, há exatos dois anos, em entrevista à Folha de S.Paulo, escancarei ao Brasil o esquema de aluguel de parlamentares pelo PT -o mensalão. O país mergulhou em uma de suas mais graves crises políticas. À frente do processo -e no seu pedestal carcomido de vestal-, o PT. Fui criticado e cassado. O governo não viu, não sabia, não ouviu. Exatos dois anos depois, estampadas na Folha, o que temos? Manchetes sobre corrupção. O que antes era visto como sujeira dos pequenos partidos, ávidos por migalhas, hoje respinga em todas as siglas, derrubando ministros, ex-governadores, delegados de polícia e procuradores. A Navalha corta a carne de muitos. Saímos das cuecas e malas pretas para esquemas sofisticados de uso de recursos públicos. Novamente, o governo não viu, não sabia, não ouviu. Na rua, sempre me perguntam por que protegi o Lula. Ainda nesta semana, em Brasília, fui questionado por um senhor: "Por que não acabou com tudo, de uma vez?". Respondi: ative-me ao que presenciei. O que poupei no passado, para minha tristeza, se desmancha no presente. Lula ganhou a primeira eleição com prática inversa ao discurso. Dizia: "Fora, FMI" e já tinha acertado com a instituição; batia nas altas taxas de juros e estava comprometido com os banqueiros. Tinha discurso socialista, mas fez e faz governo populista (Bolsa Família e muita retórica), com 60% de aprovação do povão. É um operário que perdeu o dedo no torno e conta com o apoio do grande capital. Há candidato melhor? Lula confundiu o cenário quando migrou para o centro do espectro político e passou a defender teses econômicas que condenou na gestão Fernando Henrique. Imaginávamos uma guinada à esquerda, mas ele optou pelo centro -aquietou o mercado. Foi mais radical que FHC: o impulso reformista se esvaziou no primeiro ano. Não houve nem há ideologia. É toma lá, dá cá. Se no mensalão o "líder do governo" era o "Carequinha de Belo Horizonte", que gerava os "argumentos reais" para manter a base afinada no Congresso, agora o "líder" é Paulo Lacerda, diretor-geral da Polícia Federal, que constrange aqueles que tentam criar embaraço, exigindo mais do que o governo está disposto a ceder, como vinha fazendo o PMDB. Resultado: navalhada na carne, os peemedebistas ficaram sem o PAC -52% dos recursos são da esfera do Ministério de Minas e Energia. E tome operações midiáticas. O povão vai ao delírio. O PT não mudou, apenas trocou PTB, PR e PP pelo PMDB. A crise moral de hoje é igualzinha à anterior. O Brasil está doente. Lula surfa nas crises e todos estão com ele. Até a oposição. O que os une? O desavisado concluiria: um projeto de nação! Não. Lula tem é projeto político. Movimenta-se para fazer o sucessor e voltar -em 2014? Com uma concentração brutal de arrecadação nas mãos do Estado, ele tem a chave do cofre e sabe usá-la. Até o PSDB mudou. Envergonhou-se das privatizações. Geraldo Alckmin usou o uniforme dos Correios, o chapéu do Banco do Brasil e o escudo da Petrobras. Fez como o adversário. O Brasil precisa de um partido conservador moderno, com coragem de defender as privatizações e acabar com o baronato. Vamos rediscutir o papel do Estado. Sem medo. Da "excelente" política fiscal de Lula o que resultou? Respondem os ex-empregados do setor gaúcho de calçados, da indústria têxtil, de eletrodomésticos etc. Teremos como competir com China, Índia? PAC? Que piada! Na esteira do casamento de cobras e lagartos, rentistas e socialistas, a renda da classe média, acima de três mínimos, caiu 46% nos últimos seis anos. Há um saldo negativo de 2 milhões de empregos no período. Os governos supostamente de esquerda na América Latina são uma grande fraude. Empresas e bancos estatais se tornaram aparelhos partidários do poder. Lula suprimiu direitos de aposentados e pensionistas, mas se nega a avançar na privatização das estatais, lugar de negócios e cabide de empregos da esquerda dirigente. Devemos caminhar para o parlamentarismo, fazer a reforma política, ter fidelidade partidária. Vamos reformar o capital, enfrentando os rentistas. Privatizar as estatais e defender as leis sociais do trabalho e da Previdência. O PTB, que presido, pretende se firmar como um partido de centro-direita. Mas vai seguir esse caminho de forma institucionalizada, lembrando seus compromissos históricos com o trabalho. O céu de brigadeiro na economia mundial nos poupa de uma crise econômica. O governo Lula é uma bóia ao sabor da correnteza em praia do Caribe. Mas o Triângulo das Bermudas está logo ali. Fiz a minha parte. Agora é a vez de vocês.


A revolução educacional chega ao Brasil
'O governo Lula se propõe alcançar o nível dos países mais desenvolvidos em 15 anos. Menos de 1% das localidades do Brasil tem um nível educacional aceitável, num sistema que é excludente'

O governo Lula se propõe alcançar o nível dos países mais desenvolvidos em 15 anos. Menos de 1% das localidades do Brasil tem um nível educacional aceitável, num sistema que é excludenteBernardo GutiérrezNo Rio de JaneiroMais professores, melhores salários, mais lugares nas universidades públicas. Prêmios para as escolas com melhores resultados, incentivos aos doutorados, computadores para todos os colégios públicos. A revolução educacional, a grande conta pendente do presidente Lula da Silva em seu primeiro mandato, está prestes a começar no Brasil. É que numa república de tamanho continental, onde a educação é transferida para as prefeituras, o sistema está à beira do naufrágio. Os salários dos professores estão no chão. As greves paralisam os anos letivos nas universidades e o nível do ensino primário chega ao fundo.Para evitar o declínio do ensino, o presidente Lula acaba de lançar com ostentação o Plano de Desenvolvimento da Educação, um pacote de 47 medidas que afetarão profundamente todos os níveis do ensino brasileiro. Lula, escoltado por seu flamejante e eficiente ministro da Educação, Fernando Haddad, falou há alguns dias sobre sua nova revolução: "Vejo no plano o início do século da educação no Brasil. Um século que garantirá a primazia do talento sobre a origem social e do mérito sobre a riqueza familiar. Um século de uma elite de competência e de saber, e não de uma elite de sobrenome".O objetivo é ambicioso e não é outro senão situar o Brasil na média educacional dos países desenvolvidos, da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), num prazo de 15 anos. Um estudo do governo brasileiro calculou que na OCDE a medida de conhecimentos, batizada como índice de desenvolvimento da educação básica, é de 6. No Brasil chega a apenas 3,8. E o que é pior: só 33 dos 4.350 municípios do Brasil (apenas 0,8%) têm um nível educacional considerado aceitável. Em regiões como o paupérrimo nordeste, terra natal de Lula, a situação é catastrófica: lá se encontram 81% das escolas brasileiras com um índice entre 0,3 e 2,7. A radiografia do Ministério da Educação revelou que 700 mil alunos do Brasil (1,5% do total) estudam em 18 mil escolas sem energia elétrica.Para acabar com o terceiro-mundismo educacional, o governo Lula vai aplicar um amplo pacote de medidas que abrangem todos os níveis educacionais. Antes de aplicar o chamado Plano de Desenvolvimento da Educação, o governo vai aumentar para 390 milhões de reais (cerca de 144 milhões de euros) o programa dinheiro direto à escola, que pretende equilibrar, sem intermediação de prefeituras ou estados, os orçamentos educacionais dos municípios. Embora a Constituição obrigue as prefeituras a destinar uma porcentagem mínima à educação, isso nem sempre é cumprido.O plano pretende criar 150 escolas técnicas em cidades pólo (normalmente situadas no interior) e aumentar em 20% os lugares nas cobiçadas universidades públicas. Além disso, graças ao programa ProUni, as universidades privadas criarão 100 mil lugares para alunos de baixa renda em troca de incentivos fiscais. Para tanto, serão criados 2.800 novos cargos de professores e 5 mil técnicos e administrativos nas universidades. O salário mínimo dos professores será estabelecido por lei em 850 reais, o que representará um aumento de quase 50%.Além disso, Lula prometeu que todos os colégios da rede pública receberão computadores até 2010 e que comprará 2.500 ônibus escolares, transporte muito importante nas localidades do interior. A introdução de prêmios para as escolas que cumpram seus objetivos e sanções para as que não cumprirem é outra das medidas contidas no citado plano.Mas nem tudo que brilha é ouro. E as críticas não demoraram a aparecer. O ministro da Educação, Fernando Haddad, reconhece que precisa de cerca de 3 bilhões de euros até 2010 para que o plano não descarrilhe. O atual ajuste fiscal do Palácio do Planalto (como é conhecido o Executivo brasileiro) poderia impedir a revolução educacional de Lula. "Não adianta criar escolas técnicas novas se não pudermos contratar professores", afirma Manuela D'Avila, deputada do Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Cristovam Buarque, ex-ministro da Educação de Lula, mostra-se cético com o plano e o considera "um passo a mais dos que foram dados nos últimos 20 anos"; enquanto para Amilcar Bezerra, professor da Universidade Boa Viagem em Recife, "o aumento dos salários é fundamental, mas não suficiente, porque também é preciso investir na formação contínua dos professores".Daniel Quaranta, professor da Universidade UniRio do Rio de Janeiro, afirma que o grande problema é um sistema educacional altamente excludente: "Coloca-se uma prova de acesso dificílima na universidade pública. Só entra quem tem uma boa formação básica, e isso poucas vezes acontece com a população proveniente de colégios públicos".Walter Carvalho, professor da Universidade do Pará, afirma que existe uma falta de compromisso histórico dos governos brasileiros com a educação. Em troca, Marilza Regattieri, coordenadora de educação da Unesco no Brasil e que participou da elaboração do plano do governo, considera fundamental a participação da família no processo e mostra-se convencida de que "sem um incentivo familiar nada vai mudar no Brasil".
Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves - FS


http://posturaativa.blig.ig.com.br/

segunda-feira, junho 04, 2007

Por uma Operação Guilhotina

Fritz Utzeri, jornalista (JB - 03 de junho de 2007)


É triste saber que toda uma geração de brasileiros, hoje com 25 anos, jamais viu o Brasil crescer. A constatação é do ex-ministro do Planejamento João Paulo dos Reis Veloso, um homem que serviu à ditadura, mas saiu moralmente incólume da experiência e que, além disso, até hoje pensa o Brasil, organiza seminários para tentar entender o que há de errado conosco.
São 25 anos que nosso país marca passo, crescendo em média 0,6% ao ano (5% seria o mínimo para absorver apenas a mão- de-obra que chega ao mercado de trabalho), ou até anda para trás. Os jornais, os noticiários não falam de outra coisa que não seja corrupção, crime e violência. Abrir o jornal ou assistir aos noticiários da TV se transformou num exercício diário de masoquismo.
Um desalento crescente vai tomando conta dos brasileiros que constatam que a corrupção e a falta de vergonha de nossas elites atingem o patamar do insuportável. Não contentes em roubar, pilhar, saquear, agora escarnecem da opinião pública (será que isso existe no Brasil?), tripudiam, espezinham e fazem pouco caso de nossa indignação, tomam-nos por imbecis (que somos), crescem felizes e soberbos e prosperam na maior impunidade, com a cobertura e o beneplácito da Justiça e da força.
De nada adiantam as operações espetaculares da Polícia Federal (em grande fase, malgré tout), mas o que está errado é a lâmina usada. O Brasil não precisa de "Operação Navalha". Navalha é lâmina de malandro e de malandros andamos todos fartos até o nariz. A única maneira de o povo ser respeitado (e temido), por essas elites sem vergonhas e predadoras é mudar a lâmina com urgência. Sai a navalha e entra a guilhotina. O Brasil precisa é de uma "Operação Guilhotina" para que se estabeleça um mínimo de respeito e moralidade no trato da coisa pública.
E não estou sendo metafórico ao me referir à guilhotina, estou sendo literal, falo da engenhoca - criada pelo doutor Guilhotin - que decepa cabeças com uma eficiência até hoje não igualada. Mas para isso seria preciso que o povo saísse da apatia e fosse às ruas movido por uma justa revolta. O problema é que somos bonzinhos demais, pacientes demais, covardes demais e imaginem outras "qualidades demais" que herdamos de nossos antepassados escravos e escravocratas, para constatar a impossibilidade de tal hipótese. A revolta no Brasil é cega, não dirigida, caótica e se materializa numa violência geral e indiscriminada que não leva a nada, salvo a um clima de medo e insegurança gerais, contribuindo para reforçar a alienação e o domínio da cleptocracia.
Os últimos levantamentos divulgados sobre a corrupção assustam. Segundo o próprio Ministério da Justiça, o Brasil perde entre R$ 25 bilhões e R$ 40 bilhões anualmente - um total maior do que a verba do Ministério da Saúde, devido à corrupção, e isso apenas no setor das licitações, ou seja, esse dinheiro vai para o bolso de quadrilhas (como a da empreiteira Gautama) que se organizam para combinar preços entre si e assaltar a bolsa da viúva. Esses cartéis de empreiteiros acabam provocando um sobrepreço de 40% nas obras públicas.
Como aqui não temos a mais remota esperança de que os corruptos virem japoneses e comecem a se suicidar em massa (ia ser uma carnificina), esperamos pelo menos que algum dia sejam aplicados outros métodos mais "modernos". Atualizando a proposta da guilhotina, as coisas só tomarão jeito entre nós, reduzindo a incidência da corrupção, no dia em que as famílias dos corruptos (corrompidos ou corruptores) pagarem pela bala...

http://posturaativa.blig.ig.com.br/