sexta-feira, maio 30, 2008

O déficit do governo caiu ou subiu?

VINICIUS TORRES FREIRE
Mesmo com receita recorde, balanço de União, Estados e cidades mostra que falta mais dinheiro para fechar a conta

O "GOVERNO" não fechava seu balanço no azul, num início do ano, desde que começou a fazer essa conta direitinho, faz uns 17 anos. Era o que a gente ouvia ontem, de maneira mais ou menos enrolada, depois que foram divulgados os "resultados fiscais do setor público". Ouvia-se que o governo teve superávit nominal entre janeiro e abril. Mas estão dourando a pílula -o déficit do setor público aumentou, no acumulado de 12 meses.
O "governo", no caso, não é apenas aquele administrado por Lula. As contas do setor público, de onde sai a numeralha de superávits e déficits, primários e nominais, é o balanço de receita de impostos e despesas de governo federal (inclusive INSS e Banco Central), Estados, municípios e estatais. Como o governo federal é maior e dispõe de mais facilidade de manipular receita e despesa, recebe mais destaque, ataques etc.
Como se dizia, o déficit do setor público acumulado em 12 meses aumentou, de março para abril. Por que fazer a conta somando os dados dos últimos 12 meses, como se o ano houvesse terminado em abril? Para evitar o efeito muita vez ilusório de flutuações típicas de um período do ano ("sazonais"). Pensando na economia doméstica: a gente tende a se dar mal se achar que teve um "superávit" (ficou no azul) baseado só no salário de dezembro, pois nesse mês se recebe o décimo terceiro.
O governo teve déficit nominal nos últimos 12 meses -isso inclui a conta de juros. O governo ("setor público") vem tendo superávit primário (que não inclui a conta de juros) faz uma década e pouco, mas ainda fica no vermelho quando põe no balanço a conta dos juros da dívida pública. Fica no vermelho no equivalente a 1,9% do PIB. São R$ 50 bilhões. Mais que todo o orçamento federal da saúde para este ano.
Isto posto, ressalte-se, o déficit do setor público cresceu de março para abril devido à poupança menor de Estados, cidades e das estatais federais. Estados e municípios também pouparam menos de janeiro a abril.
Tanto o resultado melhor nos últimos 12 meses como o deste ano, alardeado ontem, deveram-se quase todos ao governo federal, de Lula.
Por que o resultado do governo federal melhorou de dezembro para cá (no déficit nominal)? Cerca de 45% da melhora deveu-se à queda relativa da despesa com juros. Uns outros 13% devido à redução do déficit do INSS (da Previdência). O resto veio de maior superávit primário (despesas menos receitas, sem contar gastos com juros). Bom?
Bem, a receita federal de impostos vem crescendo muito, 12% ao ano.
Tem havido muita receita extraordinária, e o governo gastava menos em parte porque não tinha Orçamento aprovado até março. Mas o resultado positivo deste início de ano tende a não se repetir -o próprio Orçamento federal prevê um aumento de gastos de 12% em 2008. A despesa com juros vai engrossar. E o PIB não deve crescer como em 2007.
Enfim, o superávit primário acumulado em 12 meses, ora em 4,23% do PIB, tende a se aproximar mais do resultado previsto na meta oficial (de 3,8%). Em março, o superávit era maior, de 4,46% do PIB. Se o ano tivesse terminado em abril, o superávit primário teria sido inferior àquele que o Ministério da Fazenda pretende atingir a fim de financiar seu fundo soberano.