quarta-feira, junho 06, 2007

O Brasil está doente

ROBERTO JEFFERSON - FSP
Escancarei o mensalão. O governo não viu, não sabia, não ouviu. Exatos dois anos depois, o que temos? Manchetes sobre corrupção
O DIA 6 de junho é um marco. De vergonha. Neste dia, há exatos dois anos, em entrevista à Folha de S.Paulo, escancarei ao Brasil o esquema de aluguel de parlamentares pelo PT -o mensalão. O país mergulhou em uma de suas mais graves crises políticas. À frente do processo -e no seu pedestal carcomido de vestal-, o PT. Fui criticado e cassado. O governo não viu, não sabia, não ouviu. Exatos dois anos depois, estampadas na Folha, o que temos? Manchetes sobre corrupção. O que antes era visto como sujeira dos pequenos partidos, ávidos por migalhas, hoje respinga em todas as siglas, derrubando ministros, ex-governadores, delegados de polícia e procuradores. A Navalha corta a carne de muitos. Saímos das cuecas e malas pretas para esquemas sofisticados de uso de recursos públicos. Novamente, o governo não viu, não sabia, não ouviu. Na rua, sempre me perguntam por que protegi o Lula. Ainda nesta semana, em Brasília, fui questionado por um senhor: "Por que não acabou com tudo, de uma vez?". Respondi: ative-me ao que presenciei. O que poupei no passado, para minha tristeza, se desmancha no presente. Lula ganhou a primeira eleição com prática inversa ao discurso. Dizia: "Fora, FMI" e já tinha acertado com a instituição; batia nas altas taxas de juros e estava comprometido com os banqueiros. Tinha discurso socialista, mas fez e faz governo populista (Bolsa Família e muita retórica), com 60% de aprovação do povão. É um operário que perdeu o dedo no torno e conta com o apoio do grande capital. Há candidato melhor? Lula confundiu o cenário quando migrou para o centro do espectro político e passou a defender teses econômicas que condenou na gestão Fernando Henrique. Imaginávamos uma guinada à esquerda, mas ele optou pelo centro -aquietou o mercado. Foi mais radical que FHC: o impulso reformista se esvaziou no primeiro ano. Não houve nem há ideologia. É toma lá, dá cá. Se no mensalão o "líder do governo" era o "Carequinha de Belo Horizonte", que gerava os "argumentos reais" para manter a base afinada no Congresso, agora o "líder" é Paulo Lacerda, diretor-geral da Polícia Federal, que constrange aqueles que tentam criar embaraço, exigindo mais do que o governo está disposto a ceder, como vinha fazendo o PMDB. Resultado: navalhada na carne, os peemedebistas ficaram sem o PAC -52% dos recursos são da esfera do Ministério de Minas e Energia. E tome operações midiáticas. O povão vai ao delírio. O PT não mudou, apenas trocou PTB, PR e PP pelo PMDB. A crise moral de hoje é igualzinha à anterior. O Brasil está doente. Lula surfa nas crises e todos estão com ele. Até a oposição. O que os une? O desavisado concluiria: um projeto de nação! Não. Lula tem é projeto político. Movimenta-se para fazer o sucessor e voltar -em 2014? Com uma concentração brutal de arrecadação nas mãos do Estado, ele tem a chave do cofre e sabe usá-la. Até o PSDB mudou. Envergonhou-se das privatizações. Geraldo Alckmin usou o uniforme dos Correios, o chapéu do Banco do Brasil e o escudo da Petrobras. Fez como o adversário. O Brasil precisa de um partido conservador moderno, com coragem de defender as privatizações e acabar com o baronato. Vamos rediscutir o papel do Estado. Sem medo. Da "excelente" política fiscal de Lula o que resultou? Respondem os ex-empregados do setor gaúcho de calçados, da indústria têxtil, de eletrodomésticos etc. Teremos como competir com China, Índia? PAC? Que piada! Na esteira do casamento de cobras e lagartos, rentistas e socialistas, a renda da classe média, acima de três mínimos, caiu 46% nos últimos seis anos. Há um saldo negativo de 2 milhões de empregos no período. Os governos supostamente de esquerda na América Latina são uma grande fraude. Empresas e bancos estatais se tornaram aparelhos partidários do poder. Lula suprimiu direitos de aposentados e pensionistas, mas se nega a avançar na privatização das estatais, lugar de negócios e cabide de empregos da esquerda dirigente. Devemos caminhar para o parlamentarismo, fazer a reforma política, ter fidelidade partidária. Vamos reformar o capital, enfrentando os rentistas. Privatizar as estatais e defender as leis sociais do trabalho e da Previdência. O PTB, que presido, pretende se firmar como um partido de centro-direita. Mas vai seguir esse caminho de forma institucionalizada, lembrando seus compromissos históricos com o trabalho. O céu de brigadeiro na economia mundial nos poupa de uma crise econômica. O governo Lula é uma bóia ao sabor da correnteza em praia do Caribe. Mas o Triângulo das Bermudas está logo ali. Fiz a minha parte. Agora é a vez de vocês.


A revolução educacional chega ao Brasil
'O governo Lula se propõe alcançar o nível dos países mais desenvolvidos em 15 anos. Menos de 1% das localidades do Brasil tem um nível educacional aceitável, num sistema que é excludente'

O governo Lula se propõe alcançar o nível dos países mais desenvolvidos em 15 anos. Menos de 1% das localidades do Brasil tem um nível educacional aceitável, num sistema que é excludenteBernardo GutiérrezNo Rio de JaneiroMais professores, melhores salários, mais lugares nas universidades públicas. Prêmios para as escolas com melhores resultados, incentivos aos doutorados, computadores para todos os colégios públicos. A revolução educacional, a grande conta pendente do presidente Lula da Silva em seu primeiro mandato, está prestes a começar no Brasil. É que numa república de tamanho continental, onde a educação é transferida para as prefeituras, o sistema está à beira do naufrágio. Os salários dos professores estão no chão. As greves paralisam os anos letivos nas universidades e o nível do ensino primário chega ao fundo.Para evitar o declínio do ensino, o presidente Lula acaba de lançar com ostentação o Plano de Desenvolvimento da Educação, um pacote de 47 medidas que afetarão profundamente todos os níveis do ensino brasileiro. Lula, escoltado por seu flamejante e eficiente ministro da Educação, Fernando Haddad, falou há alguns dias sobre sua nova revolução: "Vejo no plano o início do século da educação no Brasil. Um século que garantirá a primazia do talento sobre a origem social e do mérito sobre a riqueza familiar. Um século de uma elite de competência e de saber, e não de uma elite de sobrenome".O objetivo é ambicioso e não é outro senão situar o Brasil na média educacional dos países desenvolvidos, da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), num prazo de 15 anos. Um estudo do governo brasileiro calculou que na OCDE a medida de conhecimentos, batizada como índice de desenvolvimento da educação básica, é de 6. No Brasil chega a apenas 3,8. E o que é pior: só 33 dos 4.350 municípios do Brasil (apenas 0,8%) têm um nível educacional considerado aceitável. Em regiões como o paupérrimo nordeste, terra natal de Lula, a situação é catastrófica: lá se encontram 81% das escolas brasileiras com um índice entre 0,3 e 2,7. A radiografia do Ministério da Educação revelou que 700 mil alunos do Brasil (1,5% do total) estudam em 18 mil escolas sem energia elétrica.Para acabar com o terceiro-mundismo educacional, o governo Lula vai aplicar um amplo pacote de medidas que abrangem todos os níveis educacionais. Antes de aplicar o chamado Plano de Desenvolvimento da Educação, o governo vai aumentar para 390 milhões de reais (cerca de 144 milhões de euros) o programa dinheiro direto à escola, que pretende equilibrar, sem intermediação de prefeituras ou estados, os orçamentos educacionais dos municípios. Embora a Constituição obrigue as prefeituras a destinar uma porcentagem mínima à educação, isso nem sempre é cumprido.O plano pretende criar 150 escolas técnicas em cidades pólo (normalmente situadas no interior) e aumentar em 20% os lugares nas cobiçadas universidades públicas. Além disso, graças ao programa ProUni, as universidades privadas criarão 100 mil lugares para alunos de baixa renda em troca de incentivos fiscais. Para tanto, serão criados 2.800 novos cargos de professores e 5 mil técnicos e administrativos nas universidades. O salário mínimo dos professores será estabelecido por lei em 850 reais, o que representará um aumento de quase 50%.Além disso, Lula prometeu que todos os colégios da rede pública receberão computadores até 2010 e que comprará 2.500 ônibus escolares, transporte muito importante nas localidades do interior. A introdução de prêmios para as escolas que cumpram seus objetivos e sanções para as que não cumprirem é outra das medidas contidas no citado plano.Mas nem tudo que brilha é ouro. E as críticas não demoraram a aparecer. O ministro da Educação, Fernando Haddad, reconhece que precisa de cerca de 3 bilhões de euros até 2010 para que o plano não descarrilhe. O atual ajuste fiscal do Palácio do Planalto (como é conhecido o Executivo brasileiro) poderia impedir a revolução educacional de Lula. "Não adianta criar escolas técnicas novas se não pudermos contratar professores", afirma Manuela D'Avila, deputada do Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Cristovam Buarque, ex-ministro da Educação de Lula, mostra-se cético com o plano e o considera "um passo a mais dos que foram dados nos últimos 20 anos"; enquanto para Amilcar Bezerra, professor da Universidade Boa Viagem em Recife, "o aumento dos salários é fundamental, mas não suficiente, porque também é preciso investir na formação contínua dos professores".Daniel Quaranta, professor da Universidade UniRio do Rio de Janeiro, afirma que o grande problema é um sistema educacional altamente excludente: "Coloca-se uma prova de acesso dificílima na universidade pública. Só entra quem tem uma boa formação básica, e isso poucas vezes acontece com a população proveniente de colégios públicos".Walter Carvalho, professor da Universidade do Pará, afirma que existe uma falta de compromisso histórico dos governos brasileiros com a educação. Em troca, Marilza Regattieri, coordenadora de educação da Unesco no Brasil e que participou da elaboração do plano do governo, considera fundamental a participação da família no processo e mostra-se convencida de que "sem um incentivo familiar nada vai mudar no Brasil".
Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves - FS


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